Especialistas discutem impactos das palometas nos rios gaúchos em seminário

O impacto da invasão das palometas nos rios gaúchos foi o tema central do seminário realizado nesta quarta-feira (8), em Esteio. O trabalho é liderado pelo Consórcio Pró-Sinos, com participação do Ibama, Secretaria Estadual do Meio Ambiente (SEMA), secretarias de Meio Ambiente dos municípios da Bacia Hidrográfica do Rio dos Sinos, representantes de pescadores e de universidades. O encontro foi realizado na Câmara de Vereadores. “Propusemos uma reunião de trabalho, com o objetivo de entender esse fenômeno, suas causas, implicações e eventuais maneiras de lidar e mitigar impactos negativos”, destacou o presidente do Pró-Sinos e prefeito de Esteio, Leonardo Pascoal.

As palometas, peixes da mesma família das piranhas, são típicas dos rios do Sul do Brasil, especialmente na bacia do Rio Uruguai. Por serem carnívoras, alimentam-se de outros peixes e prejudicam a atividade dos pescadores. O dourado é seu principal predador, seguido da lontra.

No primeiro bloco, destinado à discussão dos impactos ecológicos e com foco na área científica, os docentes da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Juliano Ferrer, Fernando Becker e Luiz Roberto Malabarba apresentaram a ictiofauna do RS (conjunto das espécies de peixes da região), o histórico de invasões e a caracterização da espécie. A primeira detecção de palometas (Serrasalmus maculatus) na região hidrográfica do Lago Guaíba foi registrada em 2015, por pescadores no Rio Vacacaí.

De acordo com Becker, uma hipótese para seu aparecimento está relacionada à interligação de bacias, a partir do manejo do terreno para uso da água em agricultura. “As detecções geralmente são tardias. Isso reforça a necessidade de monitorar continuamente e investigar cientificamente as vias de entrada para que se possa interromper, controlar e/ou manejar adequadamente”, observa. Em relação à caracterização da espécie, o professor Malabarba destaca que a palometa só existe nas Américas do Sul e Central. Na linhagem carnívora, são 58 espécies de piranhas e palometas, cujo hábito alimentar é mordiscar nadadeiras, além de restos de peixes, insetos e crustáceos.

No segundo momento do encontro, foram abordados os impactos econômicos da invasão. Pescadores profissionais artesanais e usuários de recursos hídricos trouxeram relatos de experiências relacionadas ao tema. Na avaliação de Gilmar Coelho, da Colônia Z5, na Ilha da Pintada, a incidência da espécie foi observada com frequência em períodos de seca, com os rios mais baixos. Paulo Denilton, que atua na Praia do Paquetá, destacou a preocupação com o registro de palometas que ingeriram ovas de outras espécies.

Cristiano da Silva Garcia compartilhou o trabalho desenvolvido pela Defesa Civil de Cachoeira do Sul, que vem monitorando os pontos onde as palometas foram encontradas, a partir de questionários e relatos de pescadores. “Essa é uma questão da Defesa Civil, por gerar transtorno econômico, social ou físico”, observa. Já a coordenadora de extensão pesqueira da EMATER, Ana Spinelli, destacou a política pesqueira e o trabalho realizado pelo Conselho Gaúcho de Aquicultura e Pesca Sustentáveis (CONGAPES).

No bloco destinado às ações de monitoramento e acompanhamento da disseminação, Raquel Pretto, da Fepam, apresentou o programa Invasoras RS. Já o pesquisador do setor de Ictiologia do Museu de Ciências Naturais da SEMA, Marco Aurélio Azevedo, compartilhou um projeto em tramitação, envolvendo 13 pesquisadores de diferentes entidades. Entre os objetivos está determinar as vias de invasão, o mapeamento de potenciais conexões entre as bacias hidrográficas Uruguai e Laguna dos Patos e entre as bacias da Laguna dos Patos e do rio Tramandaí, e ter o retrato da palometa, estabelecendo o histórico da invasão.

O professor Nelson Fagundes, do Departamento de Genética da UFRGS, apresentou o trabalho de monitoramento das palometas através de DNA ambiental. “É uma ferramenta eficiente e complementar a essas técnicas tradicionais para detecção da espécie”, explica. O evento contou com a participação do Diretor do Departamento de Gestão de Recursos Hídricos e Saneamento (DRHS SEMA), Ivo Lessa, que sugeriu a aproximação com outros atores, como o Instituto Rio Grandense do Arroz e a Secretaria Estadual de Agricultura.

O último bloco foi reservado para perspectivas de convivência e ações para mitigação e controle de danos. A promotora Ximena Cardozo, da Promotoria Regional Ambiental da Bacia Hidrográfica do Rio dos Sinos, trouxe informações sobre o Fundo para Reconstituição de Bens Lesados RS, uma fonte importante de recursos para direitos difusos e coletivos, além do Fundo Estadual de Meio Ambiente e dos Fundos Municipais do Meio Ambiente. Maurício Vieira de Souza, analista ambiental do IBAMA, apresentou o Plano Estadual de Combate à Invasão Biológica, que busca enfrentar a questão, mitigar danos e impedir novas ocorrências. Ao todo, são 32 ações, entre elas a inclusão das palometas na lista oficial de invasoras do Estado e a notificação da presença do animal por parte do poder público, entre outras medidas.

Na avaliação do professor Uwe Schulz, da Unisinos, não existe uma solução pronta para ser utilizada diante do problema. Há possibilidades a serem consideradas. Uma delas é o uso da eletricidade para diminuir ou impedir a entrada de peixes em bombas de água. É possível que seu uso impeça a expansão da área de ocorrência de uma espécie, a partir da aplicação de um campo elétrico. O representante do comitê de Bacia do Rio Vacacaí, Alexandre Swarowsky, também trouxe um relato a respeito da presença das palometas na região. “Esse tema não está originalmente no escopo de atuação do Pró-Sinos, mas impacta na vida das comunidades que fazem parte da nossa bacia hidrográfica e merece a nossa atenção. Reunir especialistas no tema nos permite avançar no enfrentamento do problema”, finalizou o diretor-técnico do Pró-Sinos, Hener de Souza Nunes Júnior.

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