Os desafios e as barreiras para inclusão e acessibilidade: Qual é o papel da sociedade?

“Falo sobre as dificuldades que enfrento no dia a dia, principalmente pela falta de corrimão nas repartições públicas, embora não em todas, mas na maioria, e as ruas de nossa cidade tem muito declínio, o que dificulta meu caminhar muitas vezes, até já caí, por ter buracos e calçadas lisas.”. Este é o relato de Jadir Burin, 50 anos, morador da cidade de Frederico Westphalen (FW), no noroeste do Rio Grande do Sul.

Burin sofreu um acidente motociclístico, no ano de 2013, o que resultou na amputação da sua perna esquerda. Desde então, ele enfrenta desafios diários e soma-se aos mais de 45 milhões de pessoas brasileiras com algum tipo de deficiência, o que representa 24% da população, de acordo com dados do Censo de 2010. Deste total, mais de 13 milhões são pessoas com deficiência física – aquelas que possuem alguma perda em sua formação de natureza fisiológica ou anatômica que atrapalhe o desenvolvimento de algumas atividades.

Com um número tão expressivo, o dia 11 de outubro foi declarado como o Dia Nacional da Pessoa com Deficiência Física. De acordo com informações do site do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, vinculado ao Governo Federal, a data foi instituída pela Lei Nº 2.795, e promulgada em 15 de abril de 1981. O intuito da Lei é promover a conscientização da sociedade sobre ações para inclusão e qualidade de vida das pessoas com deficiência física.

Pode-se pensar que compreender a necessidade da acessibilidade e inclusão é algo urgente e benéfico, não apenas para pessoas com deficiência (PCD), mas para a sociedade de modo geral, tanto no meio social, quanto organizacional. A neuropsicóloga Juliana Cerutti Ottonelli – CRP  07/16964 – confirma que as barreiras vivenciadas por um PCD são, em sua maioria, sofrimentos desnecessários, decorrentes de preconceitos e estigmas. “A Psicologia contribui no desenvolvimento da cidadania e dos direitos humanos, mediando os processos de inclusão entre sociedade e pessoa com deficiência.”, comenta Ottonelli.

E por falar em inclusão, reportemo-nos ao ambiente organizacional, para refletir sobre empregos e oportunidades. Burin conta que ainda não encontrou uma vaga para PCD em que possa se adequar. Há possibilidade de indagar como e quantas são as vagas para pessoas com deficiência nas empresas e organizações, tanto no primeiro setor (governamental), quanto no segundo setor (privadas). A profissional de Gestão de Pessoas – antigo Recursos Humanos – Adriana Tedesco, coordena contratações e admissões em uma instituição privada de ensino, e segundo ela, em um cenário não tão distante, pessoas com deficiência estavam em casa, sendo vistas pela sociedade como pessoas sem capacidade.

“Dentro das limitações de cada um, precisamos dar oportunidade e condições para que esta pessoa realize suas atividades com propósito e engajamento. Acima de tudo, não podemos contratar simplesmente para cumprir uma cota, precisamos entender que a pessoa com deficiência precisa se sentir útil e feliz no espaço em que ela e a empresa escolheram, é uma via de mão dupla.”, define Tedesco.

Quanto às relações interpessoais dentro de uma organização, Tedesco comenta que a responsabilidade de incluir o PCD não é apenas do colega de trabalho, mas sim da organização em sua totalidade. “Na medida em que os colegas vão se conhecendo, a relação se torna mais leve e acolhedora, mas precisa-se de uma conscientização de toda a organização, principalmente das lideranças, do quão importante são essas oportunidades voltadas para PCDs. Contratar essas pessoas é proporcionar a cada  uma a esperança de que não estão sozinhas, tampouco excluídas da sociedade.”, reforça a profissional. Ainda sob o olhar científico da Psicologia, a neuropsicóloga Juliana Ottonelli garante que a promoção da inclusão fortalece a cultura organizacional, bem como oportuniza a visibilidade à capacidade de trabalho da pessoa com deficiência.  

Como já mencionado, pessoas com deficiência enfrentam desafios e preconceitos, e em tempos passados, a segregação e exclusão desses indivíduos era algo comum. Separar essas pessoas por conta de apresentarem alguma deficiência física, intelectual ou algum tipo de mobilidade reduzida, poderia ser visto como uma solução para minimizar impactos e prevenir “constrangimentos”. Mas, em 1989, pessoas se uniram para acolher, e assim surgiu a Associação dos Deficientes Físicos (ADF), uma instituição sem fins lucrativos, localizada na cidade de Frederico Westphalen/RS, que visa acolher exclusivamente pessoas em situação de vulnerabilidade, que apresentam alguma deficiência física ou dificuldade de locomoção. Com funcionamento nas 24 horas diárias, a entidade oferece alimentação, tratamento fisioterapêutico e demais atendimentos/serviços básicos. Atualmente a casa conta com 12 moradores. 

Segundo levantamento realizado em sites e páginas da Internet, a ADF é um dos poucos institutos lares para pessoas com deficiência no Estado do Rio Grande do Sul. A diretora da ADF, Cecília Pessotto, atua no lar desde a sua fundação e conta sobre a importância que vê na entidade. “Nesses 35 anos, a ADF deu muitas oportunidades às pessoas com deficiência que por aqui passaram. Muitos retornaram à escola e até uma faculdade cursaram, e hoje conduzem a própria vida. Sempre apoiamos a todos com acolhimento, carinho e cuidado. Normalmente, as pessoas que por aqui passaram já não tinham mais os pais, então oferecemos o suporte necessário para terem uma vida digna.”, relata Pessotto.

Ademais, percorremos perspectivas e olhares de pessoas ligadas à pauta da inclusão e da acessibilidade. Com a história de Jadir Burin, uma pessoa com deficiência física, mais a visão científica da neuropsicóloga Juliana Ottonelli, a cultura organizacional da profissional de Gestão de Pessoas Adriana Tedesco, e a trajetória de trabalho, acolhimento e superação de Cecília Pessotto e toda a equipe e moradores da Associação do Deficiente Físico, pode ser possível ver que a luta pela inclusão e acessibilidade está em muitas mãos, munidas de esforços, e é urgente e necessária. Existem muitas outras histórias de PCD que possivelmente lutam todos os dias por uma vaga exclusiva no estacionamento, ou por uma rampa para acessar um espaço público. Embora leis e políticas públicas possam cooperar para um entendimento da população quanto à importância da pauta, é preciso reforçar que uma deficiência ou condição especial não invalidam, mas preparam para desafios e superações.

Texto e fotos produzidos pelos acadêmicos Eloísa Andrades, Francisco Carvalho Soares e Ryan Decezaro, para assessoria de comunicação na Associação dos Deficientes Físicos de Frederico Westphalen, por meio da disciplina Assessoria de Relações Públicas II, sob orientação do Prof. Dr. Jones Machado, no curso de Relações Públicas da UFSM/FW

Comentar