Brasil encerra 2020 com recorde de queimadas em uma década

O Brasil encerrou 2020 com o maior número de focos de queimadas em uma década, de acordo com dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Foram registrou 222.798 focos, contra 197.632 em 2019, um aumento de 12,7%. Os números só ficam atrás do recorde de 2010, quando o país registrou cerca de 319 mil focos.

Segundo a assessora de políticas públicas do Greenpeace Brasil, Luiza Lima, seja por inação ou por ações efetivas, tem uma política ambiental orientada para a destruição dos biomas. “A gente não viu, até o momento, – e tudo indica que não vamos ver para o próximo ano –, algum tipo de reversão dessa política orientada para esses desastres ambientais”, afirmou.

Em 2019, desmatamentos e queimadas foram responsável por 72% das emissões do Brasil, segundo dados do Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa (SEEG).

Os números

No Pantanal, que registrou 22.119 ocorrências, os focos de queimada cresceram cerca de 120% a mais que no ano anterior. É o maior número de queimadas observadas no bioma desde o início da série histórica do Inpe, em 1998.

O bioma pantaneiro também foi o que registrou o maior aumento de focos de queimada. Até novembro, mais de 40 mil km²  de vegetação haviam sido devastados pelo fogo, o que representa 30% da área total do Pantanal.

Já na Floresta Amazônica, foram 103.161 focos de queimadas, ante 89.171 em 2019, um aumento de 15,7%, o maior número contabilizado pelo Inpe desde 2017. A taxa oficial de desmatamento ficou em 11.088 km², 70% maior que a média da década anterior (6.500 km² por ano).

“Boiada”

Lima destacou a retórica utilizada pelo ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, que minimizou a responsabilidade do governo no combate aos incêndios. A justificativa para o fogo no Pantanal foi que uma seca atípica teria atingido a região. Já a ação dos grileiros, que buscam desmatar o território para ampliar áreas de pastagens, foi relativizada.

Da mesma forma, no ano anterior, quando os incêndios atingiram mais fortemente a região amazônica, o governo federal tratou de colocar a culpa nos indígenas e nas ONGs que atuam na região.

Por outro lado, a ambientalista lembrou da célebre frase pronunciada por Salles, de que era preciso aproveitar a pandemia para “passar a boiada”. O termo foi utilizado durante reunião ministerial em abril, em referência ao esforço do governo para flexibilizar a legislação de proteção ambiental.

Como exemplo, ela citou a insistência do governo em fazer avançar, mesmo durante a pandemia, a Medida Provisória MP 910/2019, conhecida como MP da Grilagem. Diante das pressões da sociedade civil, inclusive internacionalmente, e das dificuldades de tramitação da medida, em função da suspensão dos trabalhos das comissões do Congresso Nacional, a MP acabou caducando. No entanto, o governo reapresentou a proposta de regularização fundiária, agora na forma do Projeto de Lei (PL) 2633/2020.

Estrangulamento orçamentário

Além das propostas legislativas que beneficiam grileiros, Lima também destacou a redução dos investimentos em políticas de preservação ambiental como outra mostra do projeto de “destruição” do governo. Até setembro de 2020, por exemplo, o ministério do Meio Ambiente havia gasto apenas 0,4% do orçamento para políticas ambientais, de acordo com levantamento do Observatório do Clima.

Também destacou interferências que paralisaram a aplicação de recursos dos Fundo Amazônia e Fundo do Clima. O primeiro tem mais de R$ 3 bilhões em recursos, que foram congelados depois que o ministério alterou a composição do seu conselho gestor. Contudo, a redução da participação da sociedade civil no conselho desagradou aos investidores europeus, que repassam recursos para o fundo.

Para 2021, a especialista também chama a atenção para a redução dos recursos previstos para o Ibama e o ICM-Bio, órgãos vinculados ao ministério. Pela proposta de orçamento enviada pelo governo, as verbas para o ICM-Bio terão corte de 12,8%. Já para o Ibama, a redução prevista é de 4%. Segundo Lima, dessa forma, não haverá recursos para ações de combate a incêndios, nem para a gestão de unidades de conservação.