Suco, banana e leite em pó: polícia investiga se suspeita de envenenar bolo no RS usou arsênio em alimentos ingeridos por outros familiares

O caso do bolo envenenado com arsênio, que resultou na morte de três membros de uma mesma família durante o Natal, em Torres (RS), completa um mês nesta quinta-feira (23). Deise Moura dos Anjos é a principal suspeita de ter envenenado a farinha usada para preparar o bolo, que foi feito por sua sogra, Zeli dos Anjos, para uma reunião de família.

Deise segue presa temporariamente pelo crime e também está sendo investigada pela morte do sogro, Paulo Luiz dos Anjos, em setembro do ano passado. Após a exumação do corpo de Paulo, exames confirmaram envenenamento com arsênio. Ele consumiu bananas e leite em pó levados por Deise para sua casa.

A investigação também revelou que a suspeita pode ter envenenado o marido Diego Silva dos Anjos e filho dias antes do incidente com o bolo. Amostras de sangue e urina de ambos foram enviadas ao Instituto Geral de Perícias (IGP), que detectou a presença de arsênio na urina deles. No entanto, a investigação ainda não confirma se o envenenamento foi intencional. Deise é suspeita de ter colocado arsênio em um suco de manga consumido pelo marido e filho.

As mortes

A Polícia Civil informou que sete pessoas estavam reunidas na casa da família em Torres para comer um bolo de reis, no dia 23 de dezembro, quando começaram a passar mal. Apenas uma delas não havia comido o bolo. Zeli, que preparou o bolo em Arroio do Sal e o levou para Torres, também foi hospitalizada. A investigação apontou que a farinha usada no bolo foi a fonte da contaminação por arsênio.

Três mulheres da família morreram em poucas horas. Tatiana Denize Silva dos Anjos e Maida Berenice Flores da Silva sofreram parada cardiorrespiratória, enquanto Neuza Denize Silva dos Anjos morreu devido a “choque pós-intoxicação alimentar”. A polícia acredita que Zeli foi o principal alvo de Deise, pois ela foi a única a consumir duas porções do bolo e ficou internada por 19 dias.

A prisão de Deise Moura dos Anjos

Deise é casada com Diego Silva dos Anjos, filho de Zeli, e morava em Nova Santa Rita, na Região Metropolitana de Porto Alegre. Ela está presa temporariamente desde domingo (5). A suspeita passou por audiência de custódia e a Justiça decidiu que a investigada permanecerá presa por 30 dias.

Deise é suspeita de triplo homicídio duplamente qualificado e tripla tentativa de homicídio duplamente qualificada. Ela está detida no Presídio Estadual Feminino de Torres.

Exumação do corpo de Paulo

Após suspeitas, a polícia solicitou a exumação do corpo de Paulo Luiz dos Anjos, sogro de Deise. Paulo faleceu em setembro de 2024, sob suspeita de uma infecção intestinal, após consumir bananas e leite em pó levados à casa dele por Deise.

A perícia do IGP confirmou que ele foi envenenado com arsênio, e os níveis encontrados no corpo eram letais, caracterizando envenenamento por ingestão oral.

Depoimento de Deise

Deise relatou à polícia em depoimento, que mantinha um relacionamento conflituoso com a sogra e outros membros da família, com discussões frequentes, especialmente relacionadas a questões financeiras. A sogra teria até bloqueado Deise nas redes sociais após um desentendimento. Inclusive, ela disse aos policiais que chamava a sogra de “Naja”.

Ela mencionou que, após a morte do Paulo, procurou informações sobre venenos fatais, pois havia dúvidas sobre a causa do falecimento.

Compra do arsênio pela internet

A polícia confirmou, durante uma coletiva de imprensa na sexta-feira (10), que Deise comprou arsênio quatro vezes em um período de quatro meses. Uma das compras ocorreu antes da morte do sogro – que faleceu por envenenamento – e as outras três, antes da morte de três pessoas que consumiram o bolo envenenado, em dezembro. O veneno teria sido recebido pelos Correios. O documento estava salvo no celular da suspeita, apreendido durante a investigação.

 

“A gente não tem dúvida de que se trata de uma pessoa que praticava homicídios e tentativas de homicídios em série, e que durante muito tempo não foi descoberta, e durante muito tempo tentou apagar provas que pudessem levar a atribuição de culpa a ela”, afirmou a delegada regional do Litoral Norte do RS, Sabrina Deffente.

Contaminação da farinha

A investigação aponta que a farinha do bolo pode ter sido contaminada quase um mês antes do episódio fatal. De acordo com o delegado Marcos Vinícius Veloso, Deise esteve em Arroio do Sal no dia 20 de novembro, o que pode ter sido o momento em que o veneno foi adicionado à farinha usada no bolo consumido em Torres.

 

“As informações que nós temos no inquérito policial são de que a investigada esteve na cidade de Arroio do Sal, na última vez, no dia 20 de novembro. E, pelas informações que já foram coletadas do inquérito, nesta data a Polícia Civil acredita que possa ter ocorrido o envenenamento da farinha que foi utilizada no bolo que foi consumido na cidade de Torres”, afirmou o delegado.

 

Visita a Zeli no hospital

A Polícia Civil também investiga se Deise levou alimentos contaminados com arsênio para Zeli, enquanto ela estava internada no Hospital Nossa Senhora dos Navegantes, em Torres. A família de Zeli entregou esses alimentos à polícia após Deise ter feito a visita, mas Zeli não chegou a consumir os itens porque foi impedida por quem a acompanhava.

Além de um pastel de padaria, outros itens também foram coletados e são investigados: quatro bombons, um chiclete, quatro barras de cereal, uma garrafa de suco de uva, um torrone, um biscoito de leite, além da garrafa do suco e do canudo.

De acordo com o IGP, a conclusão da análise não tem prazo para ser concluída, mas ainda não está descartada a possibilidade de conter o veneno em um ou mais desses alimentos.

Outros envenenamentos

A polícia segue investigando se Deise também adicionou arsênio a um suco consumido pelo marido e filho. Nesta segunda-feira (20), exames detectaram a presença da substância na urina de ambos. A investigação ainda não confirma se o envenenamento foi intencional.

A investigação aponta que marido e filho de Deise teriam tomado um suco de manga, em dezembro, dias antes da família comer o bolo.

 

“Ao que tudo indica, o consumo do suco feito pelo filho da investigada não foi acidental. Então, mais detalhes eu não posso conceder neste momento, mas ele não foi acidental”, afirmou o delegado. “Não foi acidental o consumo do suco, seja por parte do marido da investigada, seja por parte do filho da investigada”, completou o delegado Marcos Vinícius Veloso.

Novos depoimentos

Diego e Zeli prestaram novos depoimentos à Polícia Civil nesta semana, ambos como testemunhas. A informação sobre os depoimentos foi confirmada ao g1 pela Polícia Civil do RS, que informou que Zeli ajudou a esclarecer alguns pontos sobre as motivações de Deise para supostamente envenenar a família.

O marido relatou ter sofrido “vômitos violentos” após tomar um suco preparado pela suspeita. Já Zeli confirmou que achou a farinha do bolo de reis “estranha”. A íntegra foi obtida com exclusividade pelo repórter Humberto Trezzi e Fábio Schaffner, do jornal Zero Hora.

A defesa de Deise

O advogado Cassyus Pontes , que representa Deise, informou que obteve os laudos preliminares do IGP, incluindo o laudo da exumação de Paulo, e contratou peritos criminais particulares para analisar os documentos. No entanto, a defesa afirma que ainda não teve acesso aos laudos dos exames do marido e filho de Deise.

“A defesa da acusada Deise, representada pelo escritório Cassyus Pontes Advocacia, vem se manifestar no sentido de que houve acesso aos laudos preliminares do IGP, quanto aos fatos ocorridos na Comarca de Torres, bem como o da exumação do corpo do Sr. Paulo Luiz dos Anjos.

Desta forma, já há contato com peritos criminais particulares para avaliação da documentação oficial e notícias veiculadas pelos meios midiáticos. Entretanto, não há ainda a disponibilidade dos laudos referentes ao filho de Deise dos Anjos e seu companheiro, razão pela qual no momento não há judicialização das supostas novas vítimas. Deise permanece recolhida com prisão temporária, a investigação segue, e conforme decisão judicial, ainda restam diligências a serem realizadas para a elucidação dos fatos no inquérito.”

Fonte: g1 RS

Foto: Divulgação