Por Marina Oliveira, estudante de Jornalismo na Universidade Federal de Santa Maria, campus Frederico Westphalen
Putas e santas, recatadas e expansivas, frágeis e insensíveis. E, não ou, porque nascemos e morremos lutando pelo direito de ser, embora este nos seja negado desde o princípio quando, por medo, insegurança ou qualquer outra fragilidade – típica do gênero masculino – decidiram apagar as nossas histórias. Somos tanto, muito além de qualquer dualidade em que tentem nos encaixar. Sempre “há uma história que não está na história e que só pode ser resgatada aguçando os ouvidos e escutando o sussurro das mulheres”, como afirma Rosa Montero.
Mulher, jornalista (e muito mais), a escritora recupera na obra Nós, mulheres a história de personalidades femininas que lutaram por sua existência e, consequentemente, a de todas nós, mulheres. Montero destaca o apagamento histórico das mulheres ao longo do tempo como importante ferramenta de manutenção do patriarcado. Fossem elas heroínas ou vilãs, não nos cabe julgar, afinal este é um exercício masculino. A questão é: viemos de uma história de luta, mas por quanto tempo, e como, ainda teremos que lutar?
Vejo que somos a arma mais forte que temos e, enquanto seres políticos, talvez a saída seja mudar o curso da história que escreveram para nós por meio da participação política. Afinal, no país em que mais da metade dos eleitores são mulheres, é inegável que nosso futuro está em nossas mãos.
Segundo estatísticas do TSE Mulher, coletadas entre 2016 e 2022, 52% do eleitorado brasileiro é feminino, 33% dos candidatos às eleições daquele período eram mulheres e 15% das candidaturas eleitas eram femininas. Parece pouco, e é, mas já foi impossível.
Conquistamos o direito ao voto e à candidatura a cargos políticos há menos de um século. Foi o Decreto nº 21.076 de 1934 que garantiu às mulheres acima de 21 anos o ‘benefício’ do voto e também de serem votadas. Tudo isso para que, 90 anos depois, a gente tenha que ouvir de um dos candidatos à prefeitura da maior capital do país que “mulher não vota em mulher, a mulher é inteligente”.
Esse tipo de discurso, além de ignorante e contraditório, deslegitima não somente a participação política das mulheres como também a nossa existência, afinal, o patriarcado tenta – desde sempre e a todo o custo – se manter no poder.
Cármen Lúcia, mulher, jurista, professora e magistrada brasileira, atual ministra do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal Superior Eleitoral, afirmou, durante o evento Mesa Mulher na Política, em 2022, que a desigualdade de gênero é uma violência já integrada na sociedade e que nem mesmo a política foi capaz de superar isso. “Ao longo da história, as mulheres têm sido silenciadas. A falta de uma voz que seja ouvida é planejada e preparada”.
Diante de tantas limitações e impedimentos, buscar força na resistência feminina pode parecer um caminho truculento, mas recompensador.
Há dez anos a primeira mulher eleita à Presidência da República do Brasil foi reeleita. Por não ceder às imposições do patriarcado, Dilma Rousseff sofreu impeachment, declarado em 2016. As provas de inocência da presidente começaram a surgir durante o próprio processo, mas foi só em março de 2022 que o Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2) anulou a condenação. O golpe sofrido não atingiu somente Dilma, mas também – e principalmente – a democracia brasileira.
Assim como Dilma, outra importante figura da história brasileira também sofreu impeachment. Em 1992, o então Presidente da República Fernando Collor de Mello enfrentou uma situação parecida, não fosse o esquema de corrupção no governo que, neste caso, realmente existiu. Acontece que, além de culpado, Collor também é homem e, assim que teve início o julgamento do processo de impeachment , o Presidente renunciou ao cargo.
Diferente de Collor, Dilma resistiu, permanecendo no cargo até ser deposta.
A justiça nem sempre é justa, mas desistir não faz parte de quem somos. A democracia depende da força e da participação feminina para continuar resistindo.
Neste ano, pela primeira vez na história de Frederico Westphalen, município localizado no interior do Rio Grande do Sul, três mulheres foram eleitas para o cargo no Poder Legislativo, sendo que duas delas tiveram o maior número de votos entre todos os candidatos do pleito.
As revoluções levam tempo, por isso a resiliência. Sejamos então tranquilas, assim como eles esperam, enquanto se articulam para que nada fuja de seu controle. Afinal, se não podemos com eles, vamos nos infiltrar, e quando estivermos lá dentro acabamos com eles, com gentileza.
Sempre encontramos espaço, afinal, somos mulheres inteligentes, e nós, mulheres inteligentes, lutamos para ser quem a gente quiser. Por isso, mulher vota em mulher, elege mulher e reivindica os direitos de todas. Até porque, nossa existência é um verdadeiro ato político.