A comissão especial da Câmara dos Deputados que discute mudanças nas regras eleitorais aprovou nesta segunda-feira (9) uma proposta de emenda à Constituição (PEC) que prevê a adoção do modelo “distritão” e a volta das coligações nas eleições para deputados e vereadores.
Com a aprovação, o relatório segue para o plenário, ao qual caberá votar qual dos dois modelos deverá ser adotado. Em seguida, a proposta seguirá para o Senado, e o presidente do Casa, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), já afirmou que, se aprovado pela Câmara, o “distritão” não passa no Senado.
Especialistas criticam esses dois modelos. Isso porque, afirmam, o “distritão” promove políticos “celebridades”, isto é, pessoas mais conhecidas, enquanto as coligações representam “retrocesso” (leia detalhes mais abaixo).
O sistema atualmente em vigor é o proporcional, pelo qual as cadeiras de deputados são distribuídas proporcionalmente à quantidade de votos recebidos pelos candidatos e pelos partidos — ou seja, os votos nas siglas também são considerados no cálculo.
Pelo “distritão”, são eleitos os candidatos mais votados individualmente, desconsiderando os votos nas siglas.
Após negociações com líderes, a relatora, Renata Abreu (Pode-SP), alterou o texto para incluir a possibilidade de os partidos voltarem a se juntar durante as eleições proporcionais, o que o próprio Congresso decidiu extinguir em 2017 ao aprovar uma emenda Constitucional.
A expectativa é que os dois modelos sejam votados separadamente quando o plenário da Câmara votar a PEC.
O texto também previa que a decisão do plenário serviria somente como transição para um outro modelo, o chamado “distritão misto”. No entanto, este trecho foi derrubado pela comissão.
Desta forma, o plenário da Câmara deverá discutir dois modelos:
- distritão com cláusula de habilitação para permitir partidos de concorrerem;
- proporcional com volta de coligações.
Críticas aos modelos
Em outubro de 2017, o Congresso promulgou uma emenda constitucional que proibiu partidos de se juntarem em coligações para disputar as eleições proporcionais. A maior crítica ao modelo era a de que a junção de partidos permitia a eleição de candidatos mesmo que o eleitor tivesse votado em outra pessoa.
Para Marcelo Issa, diretor-executivo do Movimento Transparência Partidária, a volta das coligações nas eleições proporcionais seria um “retrocesso”.
“As coligações são alianças que têm finalidade apenas eleitoral, não são feitas com base em programas, tanto que se dissolvem ou rearranjam tão logo passada a eleição. Não há sentido em revogar um regra que foi aprovada tão recentemente, ainda mais como algo provisório”, afirmou.
Sobre o “distritão”, cientistas políticos argumentam que o sistema é o “pior” possível e favorece candidaturas de “celebridades”.
Com isso, argumentam, a disputa valoriza menos as ideias e programas partidários e se torna mais personalista, reduzindo e enfraquecendo o papel dos partidos e, consequentemente, a democracia.
“O distritão é o pior sistema eleitoral imaginável. Primeiro, porque destrói os partidos políticos, tudo passa a depender muito mais da votação em indivíduos e não na votação em partidos. [Segundo, porque] o debate de ideias também é prejudicado em função disso”, afirmou o cientista político Cláudio Couto, da Fundação Getúlio Vargas (FGV).
Quociente eleitoral
Segundo o texto “serão considerados habilitados à obtenção das vagas os partidos políticos que alcançarem votação igual ou superior a 25% do quociente eleitoral do respectivo distrito”.
Quociente eleitoral é o resultado da divisão do total de votos válidos pelo número de vagas em disputa no respectivo estado.
Para permitir que os deputados escolham retomar as coligações, a relatora incluiu no texto trecho que diz que os partidos políticos têm autonomia “para adotar os critérios de escolha e o regime de suas coligações, tanto nas eleições majoritárias, quanto nas proporcionais”.
Voto em até cinco candidatos para o Executivo
Além de mudanças nas eleições para o Poder Legislativo, o texto altera também as eleições para o Poder Executivo. Estas alterações, segundo o texto, devem valer a partir de 2024 (ano das próximas eleições municipais).
Segundo a proposta, o eleitor votará em até cinco dos candidatos que disputam a eleição, em ordem decrescente de preferência.
Pelo texto, o candidato que obtiver a maioria absoluta das primeiras escolhas válidas dos eleitores, não computados os votos em branco e os nulos, será eleito.
Se nenhum candidato conseguir alcançar maioria absoluta, a PEC estabelece que:
- o candidato indicado menos vezes na contagem será eliminado da apuração, e os votos dados a ele nesta escolha serão transferidos para a escolha seguinte do eleitor;
- os votos dos eleitores em candidato eliminado que não indicaram escolhas seguintes serão considerados nulos;
- quando a escolha do eleitor recair sobre candidato já eliminado ou for em branco ou nula, será considerada a opção seguinte;
- feita a redistribuição dos votos, realiza-se nova contagem e verifica-se se algum dos candidatos restantes alcançou a maioria absoluta dos votos, caso em que será considerado eleito;
- o procedimento previsto acima será repetido até que algum candidato alcance a maioria absoluta dos votos válidos;
- havendo empate entre candidatos menos votados em cada contagem, será eliminado o de menor idade;
- o eleitor não poderá indicar o mesmo candidato nas escolhas sucessivas que fizer.
Outros pontos
Saiba outros pontos incluídos na proposta:
- Cláusula de barreira: A proposta também altera as regras da chamada cláusula de barreira, incluindo os senadores na conta. Aprovada em 2017 pelo Congresso, a regra determina que partidos têm que conseguir um número mínimo de votos em deputados federais para terem acesso ao dinheiro do fundo partidário e ao tempo de propaganda no rádio e na TV.
- Fidelidade partidária: a proposta prevê punição de perda de mandato para deputados e vereadores que se desligarem, sem justa causa, do partido pelo qual foram eleitos. A mudança já é prevista hoje, no sistema proporcional, mas como a PEC altera o sistema eleitoral para o majoritário, houve a necessidade de explicitar a exigência da fidelidade partidária.
- Data da posse: a PEC altera a data da posse de governadores e prefeitos (passa a ser 6 de janeiro) e do presidente (passa a ser 5 de janeiro). Hoje, as posses são sempre no primeiro dia de janeiro. A mudança, porém, só valerá a partir de 2025 (para prefeitos) e 2027 (para governadores e presidente).
- Iniciativa popular: a PEC prevê a possibilidade de um projeto de lei ser protocolado por eleitores quando houver, no mínimo, 100 mil assinaturas. Tais projetos tramitarão em regime de prioridade.
- Participação feminina: a PEC prevê “peso dois” aos votos dados a mulheres e negros para a Câmara dos Deputados para o cálculo de distribuição dos fundos partidário e eleitoral às siglas, entre 2022 e 2030.