A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou nesta quarta-feira (14) uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que pode livrar os partidos políticos de multas eleitorais — a chamada PEC da Anistia.
A votação do texto ocorreu de forma simbólica – quando não há registro nominal de votos. Parlamentares e dirigentes partidários pressionam para que a conclusão da análise do texto ocorra antes das eleições municipais deste ano.
O texto ainda precisa passar pelo plenário do Senado, onde terá de reunir ao menos 49 votos favoráveis. A CCJ também aprovou um requerimento de urgência para acelerar a votação pelo conjunto dos senadores.
Com o apoio de partidos de todos os espectros, a PEC teve somente dois votos contrários: Alessandro Vieira (MDB-SE) e Oriovisto Guimarães (Podemos-PR).
O presidente do colegiado, Davi Alcolumbre (União-AP), já havia sinalizado que pediria ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), para levar a proposta à votação ainda nesta semana no plenário principal do Senado, o que líderes partidários indicaram rejeitar em reunião na última quinta (8).
- A PEC da Anistia livra os partidos políticos de multas por descumprimento de repasses mínimos para candidaturas negras e cria um perdão amplo para outras irregularidades em prestações de contas eleitorais.
O texto também lança um programa de refinanciamento de dívidas das siglas partidárias e permite a utilização de recursos do Fundo Partidário para pagar multas eleitorais.
O relatório do senador Marcelo Castro (MDB-PI) não traz o tamanho do impacto financeiro da proposta. Mas, em 2023, a ONG Transparência Partidária estimou que a versão original do texto, discutida pela Câmara, teria um custo de até R$ 23 bilhões.
Cotas para negros
A PEC propõe inserir na Constituição a obrigatoriedade de os partidos repassarem 30% dos recursos do Fundo Eleitoral — o “fundão” — para financiar campanhas de candidatos negros.
A regra estabelecida pela proposta deverá começar a ser aplicada já em 2024, caso a proposta seja aprovada no Senado.
Apesar da obrigação, a proposta não prevê um mecanismo para distribuição igualitária e equânime entre as candidaturas pretas e pardas. Pelo contrário, deixa a cargo das próprias legendas repassar os valores de forma que melhor atenda aos “interesses e estratégias partidárias”.
Atualmente, a regra sobre os repasses a candidaturas negras não está na Constituição, mas segue um entendimento do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), respaldado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), de que os recursos destinados a pessoas pretas e pardas deve ser proporcional ao número total de candidatos neste perfil no pleito.
Para entidades, o percentual definido na proposta pode representar uma diminuição dos repasses feitos às candidaturas negras — próximo a 50% atualmente.
Segundo a proposta, até a eventual promulgação da PEC, repasses em qualquer montante — mesmo os que descumpram a regra — serão validados. Na prática, os partidos estarão livres de qualquer punição por descumprimento de repasses a candidaturas negras.
Pela PEC, embora haja anistia a penalidades nesse caso, os recursos não aplicados corretamente para negros em eleições anteriores deverão ser compensados a partir de 2026. O prazo para a compensação será de até quatro pleitos.
Castro argumenta que a proposta assegura a “sustentabilidade financeira e operacional dos partidos”, com uma “transição harmoniosa sem penalidades por novas regras definidas no curso do processo eleitoral”
‘Anistia ampla’
A proposta estabelece uma espécie de “perdão” a condenações de devolução de recursos públicos e multas aplicadas aos partidos e seus institutos ou fundações por irregularidades em processos administrativos ou judiciais e até mesmo em prestação de contas.
Pelo texto, o mecanismo valerá para punições decididas há mais de cinco anos, ou para casos em que o partido não tiver quitado a condenação em um período superior a cinco anos.
Entidades ligadas à transparência eleitoral e à promoção da igualdade na política avaliam que o texto, na prática, anularia “todos os tipos de sanções aplicadas” às legendas.
“Configurando-se uma anistia ampla e irrestrita para todas as irregularidades e condenações de partidos políticos e campanhas eleitorais”, diz a nota.
A PEC também prevê que a União, estados e municípios não poderão criar impostos sobre os partidos políticos, bem como institutos e fundações ligados e mantidos pelas siglas.
Refinanciamento de dívidas
O texto aprovado pelos deputados cria um Programa de Recuperação Fiscal (Refis) voltado especificamente para partidos políticos.
O Refis vai permitir refinanciar dívidas tributárias e não tributárias. Também vai ser estendido às fundações e institutos mantidos pelas legendas. A PEC não traz um prazo para adesão nem quando o programa será encerrado.
Pelo texto, as siglas poderão parcelar, por exemplo, as dívidas junto à Receita Federal e Fazenda em até 180 meses. Débitos com o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), em até 60 meses.
A adesão do partido ao Refis vai isentar a sigla de qualquer cobrança de multa ou juros acumulados. Somente poderá ser aplicado à dívida a correção monetária.
A pedido de dirigentes partidários, o texto autoriza que as legendas utilizem recursos do Fundo Partidário — repassado pelo TSE para o pagamento de despesas de funcionamento dos partidos — para pagar o parcelamento de multas eleitorais e condenações de devolução de recursos públicos.
Também permite o uso do fundo para quitar débitos que não tenham natureza eleitoral.
Entidades avaliam que o trecho autorizaria, por exemplo, as siglas a utilizar “recursos públicos inclusive para cumprir sanções pelo recebimento de recursos privados de origem não identificada, uma das formas do chamado caixa 2”.
A proposta também desobriga partidos a apresentar recibos, em prestações de contas, para doações a candidaturas recebidas por PIX.