O Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA) realizou, em 8 de janeiro, um transplante de fígado sequencial inédito no Rio Grande do Sul. Duas crianças de oito meses de idade receberam os órgãos por doações inter vivos. O procedimento mobilizou diversas equipes médicas e assistenciais e a administração do hospital.
No chamado “transplante dominó”, fígados funcionalmente normais são retirados, geralmente, de pacientes com doenças metabólicas e transplantados para pacientes que têm doenças que causam lesões irreversíveis ao órgão. “Os transplantes ocorrem em sequência. Após a avaliação do órgão retirado do primeiro receptor e confirmada a possibilidade de implante, é iniciada a cirurgia do segundo paciente”, explicou a chefe da Unidade de Gastroenterologia e Hepatologia Pediátrica e coordenadora do Transplante Hepático Infantil do HCPA, professora Sandra Maria Gonçalves Vieira.
No procedimento realizado, os beneficiados foram dois bebês. O primeiro é portador da Doença da Urina do Xarope do Bordo (MSUD), uma patologia genética que se manifesta na primeira semana de vida. O Serviço de Genética Médica do HCPA é referência nacional para o seu tratamento. Nestes pacientes, ocorre a falta de uma enzima no corpo, o que leva à deficiências motoras e cognitivas. Apenas o transplante de fígado pode promover a cura do paciente. O primeiro bebê recebeu parte do fígado de seu tio. “Exceto pela produção de uma proteína ou enzima anormal, os fígados dos pacientes com MSUD são totalmente funcionais, podendo ser transplantados em pacientes que produzem a enzima”, esclareceu o médico do Serviço de Cirurgia do Aparelho Digestivo Ian Leipnitz. Por isso, foi possível que o segundo receptor (não portador da MSUD) recebesse o fígado retirado do primeiro paciente, em um procedimento que durou cerca de 16 horas.
As crianças transplantadas já receberam alta e apresentam boa evolução pós-operatória. O doador do primeiro paciente teve alta cinco dias após a cirurgia. “A técnica do transplante de fígado sequencial surgiu como uma estratégia para aumentar o número de fígados disponíveis para transplante e não expõe receptores ou doadores a quaisquer riscos operatórios adicionais. Inclusive, a sobrevida dos receptores é tão boa quanto seria com outra modalidade de transplante”, afirmou Leipnitz. O Programa de Transplante Hepático Infantil do HCPA, que tem 27 anos de existência, é uma das referências nacionais na realização de transplantes para doença metabólica.